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Diabinha verde

07 de junho de 2012

– Ela é igual a mim – disse Bûchette a si mesma –, mas tem uma cor estranha.
A criatura verde chorosa estava semivestida com uma espécie de túnica feita de folhas costuradas. Era mesmo uma menininha, que tinha a cor de uma planta selvagem. Bûchette imaginava que seus pés estavam enraizados na terra, mas ela os mexeu com muita agilidade.
Bûchette acariciou-lhe os cabelos e a pegou pela mão. Ela se deixou levar, sempre chorosa. Parecia que não sabia falar.
– Minha nossa! Meu Deus, uma diabinha verde – gritou o pai de Bûchette, quando a viu vindo.
– De onde vem você, pequena, por que você é verde? Não sabe responder?
Não se podia saber se a menina verde tinha escutado.
(…)
Por imitação ela logou aprende a trazer lenha, água, varrer, enxugar e até mesmo costurar, se bem que tocasse o tecido com certa repulsão. Mas nunca concordou em fazer fogo, ou mesmo se aproximar da lareira.
Nesse entretempo, Bûchette crescia, e seus  pais quiseram enviá-la para trabalhar. Ela ficou triste, e à noite, sob os lençóis, soluçava baixinho. A menina verde olhava com pena sua pequena amiga. Ela fixava as pupilas de Bûchette, de manhã, e seus próprios olhos se enchiam de lágrimas. Depois, à noite, quando Bûchette chorou, ela sentiu uma mão suave que lhe acariciava os cabelos, uma boca fresca sobre sua face.
O tempo de Bûchette tornar-se uma criada se aproximava. Ela soluçava agora, quase tão lamentavelmente quanto a criatura verde, no dia em qua a encontraram abandonada em frente à Cara-de-lobo.
E na última noite, quando o pai e a mãe de Bûchette adormeceram, a menina verde acariciou os cabelos da chorona e lhe tomou pela mão. Ela abriu a porta, e estendeu o braço dentro da noite. Como Bûchette a tinha conduzido antes para as casas dos homens, ela a levou pela mão para a liberdade desconhecida.

Trecho de O Livro de Monelle, de Marcel Schwob.