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A dúvida que persiste: relato de um debate
por Ananda Carvalho.
Texto escrito para o projeto Art Book.

Em agosto de 2013, participei do debate ART BOOK: leituras, apropriações e conceitualizações na arte contemporânea, um evento de divulgação deste livro que você tem em mãos, no Node Center for Curatorial Studies, em Berlim. Entre os convidados também estavam Albert Minter e Sarah Linda Cooper, que refletiram sobre a complexidade da conceitualização da arte contemporânea, sobre o papel do curador e a produção de publicações no mesmo contexto temporal em que os artistas estão produzindo.

O crítico e historiador alemão, Albert Minter, apresentou uma leitura da enciclopédia ART BOOK com base nas reflexões publicadas em seu livro Arte do Século 21. Considerou as temáticas que caracterizam a produção de arte contemporânea, relacionando-as a artistas apresentados nesta enciclopédia. Entre elas, a dificuldade de estabelecer critérios de classificação temporal, de linguagens, ou de “ismos”, como no trabalho do pintor Edgar Kessler; a objetificação da performance nos autorretratos de Malala Ahmed; a reflexão sobre a catalogação nos trabalhos de Arthur Orthof e José dos Reis; as referências à documentação e ao processo por meio dos projetos irrealizáveis de Elliot Ford; a dissolução da autoria pela produção anônima de So and So; a ideia de que qualquer coisa pode tornar-se obra de arte nos ready-mades de Sarah Glade ou nos trabalhos “sobre o nada” das gêmeas Hamona & Hillary; entre outros exemplos.

Preferi relatar minha pesquisa de doutorado sobre os procedimentos curatoriais em exposições de arte contemporânea no Brasil. Observei que, mesmo que a produção artística contemporânea discuta a problemática do espaço, da autoria, da participação, do efêmero e do processo (conforme comentado por Albert), a maioria das exposições ainda apresenta um texto curatorial-explicativo (por vezes, descritivo; outras vezes, mais hermético) na sua entrada. A verdade é que, durante a minha pesquisa, encontrei pouquíssimas curadorias que procuraram desconstruir o modelo expositivo tradicional do “cubo branco” e/ou da “caixa preta” na última década em São Paulo, a cidade brasileira com o maior número de exposições artísticas.

Por fim, a curadora americana Sarah Linda Cooper apresentou sua experiência na publicação Creamier, uma outra espécie de enciclopédia em que 10 curadores de diferentes nacionalidades selecionam 100 artistas emergentes. Em seu relato discutiu a própria posição de ser júri, os critérios, muitas vezes subjetivos, de seleção e a responsabilidade de dar visibilidade aos artistas. Sarah terminou sua fala questionando “Quais são as diferenças entre as publicações enciclopédicas e as grandes exposições de arte contemporânea como as bienais?”.

A mesa terminou com questionamentos sobre os procedimentos dos curadores em relação à amplitude das linguagens da arte contemporânea. Aproveitando a pergunta de Sarah, minutos antes do fim do seminário, questionei o critério de escolhas dos artistas da enciclopédia ART BOOK. Afirmei que, até o momento, não conseguia entender por que a escolha desses artistas e não de outros. A situação gerou um nítido desconforto na plateia, em especial na primeira fileira do auditório, onde se localizava parte da equipe que produziu a ART BOOK. Não me importei e minha dúvida persiste. Agora, com a enciclopédia publicada, o leitor também pode emitir sua opinião.

* Ananda Carvalho é crítica de arte, professora universitária, doutoranda e mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Foi júri da Temporada de Projetos 2013 do Paço das Artes, participou da residência Ateliê Aberto #5 na Casa Tomada e foi colaboradora do Canal Contemporâneo, todas instituições de São Paulo.